
Até 7% das pessoas acima dos 70 anos podem desenvolver glaucoma. É muita gente correndo risco de perder a visão sem perceber. Foi com esse alerta que Gloria Pires e uma rede de médicos se juntaram ao Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) na maratona informativa “24 Horas pelo Glaucoma”. A ideia é simples e direta: levar informação confiável, derrubar boatos e fazer mais brasileiros marcarem consulta a tempo.
O esforço não foi só de palco e selfie. Teve painel com especialistas, conteúdo nas redes, entrevistas e uma mensagem repetida de forma clara: quanto mais cedo o diagnóstico, maiores as chances de segurar a doença. A presença de uma artista popular funciona como megafone. Em saúde pública, atenção é ouro — e a campanha tentou transformar audiência em prevenção.
Médicos que participaram dos debates chamaram atenção para um problema paralelo: a enxurrada de promessas falsas. Gente se endivida com “tratamentos milagrosos” para glaucoma, catarata e degeneração macular. O CBO e conselhos de saúde têm recebido relatos e decidiram reagir com informação verificável, linguagem simples e orientação sobre onde buscar atendimento.
Por que a campanha importa
O glaucoma é a principal causa de cegueira irreversível no mundo. Atinge de 1% a 2% da população geral, sobe para cerca de 2% após os 40 anos e pode chegar a 6%–7% depois dos 70. O dado assusta ainda mais porque a doença costuma evoluir em silêncio. No começo, não dói, não embaça, não dá sinal. Quando a pessoa percebe perda de campo visual, o dano ao nervo óptico já é permanente.
Existem vários tipos, mas o mais comum é o glaucoma primário de ângulo aberto. Ele está ligado a uma dificuldade de drenagem do humor aquoso dentro do olho, o que aumenta a pressão intraocular e, com o tempo, lesa o nervo. Há também formas mais raras, como o de ângulo fechado (que pode dar crise com dor intensa e visão de halos coloridos), além de tipos secundários por inflamação, trauma, uso prolongado de corticoide ou após cirurgias.
Alguns grupos precisam de atenção redobrada. A lista de risco inclui:
- Idade acima de 40 anos (risco cresce progressivamente com a idade).
- Histórico familiar de glaucoma (pais ou irmãos).
- Pressão intraocular elevada nas consultas de rotina.
- Origem negra ou parda, que tem incidência maior de certas formas da doença.
- Miopia alta, diabetes, hipertensão arterial e apneia do sono.
- Uso crônico de corticoide (colírio, comprimido ou inalatório) sem monitoramento oftalmológico.
Se você está em um desses grupos, não espere ter sintomas. Recomendações práticas usadas na rotina dos consultórios: checagem oftalmológica pelo menos a cada dois anos entre 40 e 60 anos, e anual após os 60. Para quem tem fatores de risco ou histórico familiar, a frequência pode ser maior, a critério do oftalmologista.
O diagnóstico combina conversas e tecnologia. O médico mede a pressão do olho (tonometria), avalia o ângulo de drenagem (gonioscopia), examina o nervo óptico (fundoscopia), testa o campo visual e pode pedir tomografia de nervo e fibras (OCT). Não é exame de 10 minutos: é acompanhamento. E aqui está a virada de chave da campanha: fazer as pessoas entenderem que “olho sem dor” não é sinônimo de olho saudável.
Exames, tratamento e como escapar da desinformação
Tratamento existe — e funciona — para segurar a doença. Em geral, o primeiro passo são colírios que reduzem a pressão intraocular. Há classes diferentes (prostaglandinas, beta-bloqueadores, entre outras) que o médico ajusta conforme resposta e tolerância. Quando necessário, entram procedimentos a laser e cirurgias para melhorar a drenagem do olho. O objetivo não é “curar”, mas estabilizar. Isso exige disciplina: pingar o colírio todo dia, voltar às reavaliações, ajustar dose quando preciso.
No SUS, o paciente pode ser acompanhado por oftalmologistas e, quando indicado, fazer cirurgia. O caminho costuma começar na unidade básica com encaminhamento para o especialista. Estados e municípios têm fluxos próprios para acesso a colírios e procedimentos; vale perguntar na rede local como funciona a dispensação e onde são os centros de referência.
E o que fazer com as promessas que aparecem na internet? A campanha dedicou boa parte do tempo a desarmar boatos. Especialistas relatam casos de pessoas que gastam muito dinheiro com “gotas naturais”, suplementos “que regeneram o nervo” ou terapias sem comprovação. Sinais de alerta:
- Promessa de cura definitiva de glaucoma com cápsulas, chás ou “energização”.
- Vendedor que pede para abandonar colírios do médico.
- Produtos sem registro na Anvisa ou sem bula clara.
- Depoimentos emocionais em vez de dados e estudos revisados.
Dica simples para não cair em cilada: verifique se o profissional tem registro médico ativo, busque o nome em conselhos regionais, veja se o tratamento aparece em diretrizes do CBO ou em revisões científicas. Se a proposta exigir pagamento alto, pressão para decidir “agora” e prometer milagre, desconfie. Glaucoma sério se trata com acompanhamento sério.
Há também o custo do atraso. Perda visual aumenta risco de quedas, fraturas, perda de autonomia e depressão. Famílias mudam rotinas para cuidar de quem deixa de dirigir, trabalhar ou se locomover sozinho. Sistemas de saúde, público e privado, gastam mais com internações e reabilitação. Investir na prevenção sai mais barato — e preserva qualidade de vida.
Por que colocar celebridades no centro dessa conversa? Porque funciona. Em campanhas de saúde, pessoas conhecidas abrem portas onde boletins técnicos não chegam. O público para, escuta e compartilha. A mensagem que a equipe de Gloria Pires vem repetindo é pragmática: exame preventivo, consulta regular e desconfiança de atalhos. Sem glamour, sem promessa vazia.
Para quem quer transformar alerta em ação, aqui vai um roteiro simples inspirado nas recomendações discutidas nos painéis do CBO:
- Marque uma avaliação oftalmológica completa se você tem 40 anos ou mais — principalmente se há casos na família.
- Anote medicamentos que usa, inclusive corticoides, e leve à consulta.
- Se o oftalmologista prescrever colírio para glaucoma, use nos horários certos. Não interrompa por conta própria.
- Guarde resultados de campo visual e OCT. Eles ajudam a acompanhar a evolução ao longo dos anos.
- Se encontrar “cura” milagrosa na internet, leve a proposta ao médico antes de abrir a carteira.
O CBO indica que a conversa não acaba com a maratona de 24 horas. A entidade pretende manter a pauta ativa, reforçando a checagem de fatos e o acesso à informação segura. A lógica é clara: quanto mais gente souber o básico — risco, exame, tratamento —, menos brasileiros vão descobrir tarde demais que tinham uma doença silenciosa avançando no escuro.
Glaucoma não precisa ser sinônimo de cegueira. Precisa, isso sim, de diagnóstico precoce, cuidado contínuo e decisões informadas. O recado da campanha ficou cristalino: marque a consulta, faça os exames e trate com orientação profissional. O resto é ruído.
Maria Cardoso
Trabalho como jornalista de notícias e adoro escrever sobre os temas do dia a dia no Brasil. Minha paixão é informar e envolver-me com os leitores através de histórias relevantes e impactantes.
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