
Na madrugada de 24 de fevereiro de 2025, Igor Melo de Carvalho, de 31 anos, vivenciou o que nenhum estudante gostaria de imaginar: ser vítima de tiro de um policial aposentado. O jornalista em formação, negro e morador da Zona Norte do Rio, voltava de um turno como garçom em uma casa de samba quando seu trajeto de moto‑táxi virou cenário de violência.
Após encerrar o serviço, Igor solicitou, via aplicativo, um moto‑taxista. O condutor que atendeu ao pedido foi Thiago Marques Gonçalves, 24 anos. Por volta das 01h30, o casal foi abordado por Carlos Alberto de Jesus, antigo militar da polícia, que, segundo relato, reagiu ao ser informado por sua esposa, Josilene da Silva Souza, de que o duo teria subtraído seu celular.
O disparo e a confusão inicial
Sem que a suposta identificação fosse confirmada, o oficial retirou a arma e disparou contra a moto. Igor foi atingido nas costas, sofrendo lesões graves no rim, baço, intestino e estômago. A gravidade foi tanta que o estudante perdeu o rim direito e precisou passar por cirurgia de emergência.
Na tentativa de fugir dos disparos, ambos saltaram de um viaduto. A comunidade ao redor ajudou a arrastar Igor até o Hospital Estadual Getúlio Vargas, onde ficou em estado crítico por dias. Enquanto isso, a polícia local prendeu Igor e Thiago sob acusação de roubo, apesar da evidente ausência de provas.
O juiz que analisou o caso rapidamente revogou a prisão. As investigações apontaram falhas nas provas, além de testemunhos contraditórios que mostraram que o casal jamais esteve envolvido no furto relatado por Josilene. O erro de identificação foi classificado como "imprudente e incorreto" pela Polícia Civil.

Desdobramentos judiciais e o eco social
O Ministério Público solicitou a prisão de Carlos Alberto de Jesus, que foi indiciado por tentativa de homicídio contra Igor e Thiago. A esposa do agente, Josilene, recebeu acusação de falsa denúncia. O caso ganhou destaque nacional quando Igor concedeu entrevista ao programa "Fantástico", do TV Globo, questionando: "Qual crime cometi? O de trabalhar? O de ser negro? O de estar na moto de madrugada?".
A repercussão foi imediata nas redes sociais e meios de comunicação. Organizações de direitos humanos e movimentos antirracismo utilizaram o caso para denunciar o violência policial contra a população negra, especialmente em áreas periféricas do Rio de Janeiro. Manifestantes apontaram que a prática de profiling racial não é exceção, mas parte de um padrão que tem raízes históricas e estruturais.
- Igor foi liberado do hospital em 2 de março de 2025, mas ainda enfrenta recuperação física e traumas psicológicos.
- Thiago, o moto‑taxista, também recebeu alta, porém permanece com sequelas devido ao choque.
- O agente aposentado permanece à espera de julgamento, enquanto sua esposa responde por falsa acusação.
- O Ministério Público recomenda revisão de protocolos de abordagem e de uso de força letal por ex‑policiais.
Do ponto de vista jurídico, o episódio evidencia lacunas na responsabilização de agentes de segurança que já deixaram o serviço ativo, mas que ainda mantêm acesso a armamento. A Lei de Uso da Força, ainda em fase de discussão no Congresso, poderia estabelecer limites mais claros para situações de suspeita, reduzindo a margem de erro que termina em tragédias como esta.
Para Igor, o futuro ainda está em construção. Ele pretende retomar os estudos em jornalismo e, segundo ele, usar a própria experiência para denunciar abusos e promover mudanças. Seu relato serve como prova viva de que o simples fato de ser negro e estar em uma moto ao amanhecer ainda pode ser interpretado como ameaça, alimentando um ciclo de violência que precisa ser quebrado.
Enquanto o caso segue nos tribunais, a sociedade acompanha com atenção, exigindo respostas concretas das autoridades e reforçando a necessidade de políticas públicas que combatam o racismo institucional e garantam segurança sem perpetuar o medo.
Maria Cardoso
Trabalho como jornalista de notícias e adoro escrever sobre os temas do dia a dia no Brasil. Minha paixão é informar e envolver-me com os leitores através de histórias relevantes e impactantes.
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