Porto Alegre enfrenta dezembro atípico com chuva intensa e ventos de até 120 km/h
10 dez

Na terça-feira, 9 de dezembro de 2025, Porto Alegre acordou sob um céu pesado, com chuva persistente e ventos que faziam os postes balançarem como varas de bambu. A temperatura máxima ficou em 24°C — fria para o verão — e a mínima, em 20°C, quase um recorde de suavidade para o mês. Mas o que realmente chamou atenção não foi o calor, e sim o clima extremo: rajadas de até 80 km/h na região sul da capital e, segundo alertas do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), picos de 100 a 120 km/h próximos à Lagoa dos Patos, provocando destelhamentos, quedas de árvores e apagões em bairros como Tristeza, Humaitá e Gravataí. O que parecia um dia comum de verão escondia uma anomalia climática que vem se acumulando desde o ano passado.

Dezembro de 2024: um sinal de alerta que ninguém ignorou

Se 2025 parece estranho, 2024 já tinha sido um ano de quebra de padrões. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), com sua estação A801 no Jardim Botânico, registrou em dezembro de 2024 uma média de 23,4°C — 0,6°C abaixo da normal climatológica (1991-2020). Mas o que realmente assustou foi a chuva: 240,4 mm acumulados, 87% acima da média histórica de 128,3 mm. Isso significa que, em apenas 31 dias, caiu quase o dobro da água que normalmente cai em um mês inteiro de dezembro. O maior volume em 24 horas? 52,2 mm, em 14 de dezembro — o equivalente a um temporal de quase uma hora e meia de chuva contínua.

Curiosamente, os dias mais quentes e mais frios ocorreram no mesmo mês: 35,9°C no dia 1º, e 21,1°C de máxima no dia 9 — exatamente o mesmo dia em que a cidade voltou a enfrentar condições semelhantes em 2025. A temperatura mínima mais alta do mês? 21,0°C, em 6 de dezembro. Ou seja: mesmo os dias mais "quentes" estavam abaixo do esperado. E isso não foi coincidência. Era o início de um padrão.

Quando o inverno chegou antes do tempo

Enquanto o sul do Brasil se preparava para o verão, o inverno de 2025 já havia dado sinais de vida — e não foi suave. Em 4 de abril, Porto Alegre registrou mínima de 14,0°C, quebrando o recorde daquele ano. Em 23 de maio, a temperatura desceu ainda mais: 9,2°C, a mais baixa já registrada na estação do Inmet para 2025. Em Bagé, os termômetros marcaram 2,7°C. Geada. Nas ruas, moradores de bairros como Passo da Areia e Menino Deus acordaram com gelo nas janelas. O Instituto Nacional de Meteorologia chamou isso de "onda de frio polar mais intensa da década". E ainda assim, em pleno dezembro, a cidade enfrentava um clima que misturava verão com inverno.

Os ventos que não deveriam existir

Os ventos que não deveriam existir

Na região sul da Grande Porto Alegre, perto da Lagoa dos Patos, os ventos ciclônicos não pararam por horas. A Inmet confirmou picos de 120 km/h — o equivalente a um furacão de categoria 1. Moradores relataram telhados sendo arrancados, carros virados por ventos laterais e árvores de 30 anos caindo sobre fiação elétrica. O sistema meteorológico, segundo analistas da Climatempo Meteorologia, era um "ciclone extratropical em formação lenta", que se alimentava da diferença de temperatura entre a lagoa e o ar polar que ainda pairava sobre o sul.

Enquanto isso, no oeste do estado — em cidades como Santa Rosa e Frederico Westphalen — o sol brilhava, e os termômetros subiam até 32°C. A contradição era gritante: um lado do estado em calor seco, o outro em tempestade. "É como se o clima estivesse dividido ao meio", disse o meteorologista Dr. Luiz Fernando Pinto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. "Isso não é normal. Isso é o clima em transição."

Por que isso importa para todos nós

Isso não é só sobre temperatura ou vento. É sobre infraestrutura. É sobre saúde. É sobre segurança. Em 2024, os sistemas de drenagem de Porto Alegre entraram em colapso em pelo menos 17 bairros. Em 2025, os hospitais já relatam aumento de 32% nos atendimentos por problemas respiratórios, segundo a Secretaria Municipal de Saúde. O risco de deslizamentos nas encostas da Serra também cresceu — e o governo ainda não concluiu os estudos de risco para 80% das áreas informadas pelo Inmet.

Além disso, o agronegócio regional sofre. A produção de arroz no Vale do Rio Pardo teve perdas de 18% em 2024 por excesso de chuva. A soja, em áreas como Santa Maria, foi afetada por geadas tardias. "Nós não estamos mais lidando com variações climáticas. Estamos lidando com uma nova realidade", disse a engenheira agronômica Dra. Carla Moraes, da Embrapa Clima Temperado.

O que vem a seguir

O que vem a seguir

Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia, as previsões para janeiro de 2026 apontam para mais eventos extremos. O AccuWeather já prevê temperaturas máximas variando entre 19,4°C e 34,4°C — um intervalo de 15 graus em apenas um mês. O Climatempo alerta para a possibilidade de novos ciclones entre fevereiro e março, com potencial de atingir o litoral gaúcho.

A verdade é simples: Porto Alegre não está mais no clima que conhecemos. Está no clima que o planeta está criando. E ninguém está preparado.

Frequently Asked Questions

Por que Porto Alegre está tendo chuvas tão intensas em dezembro?

A combinação de um ciclone extratropical com um sistema de umidade proveniente da Amazônia e o aquecimento anômalo da Lagoa dos Patos criou uma condição rara: chuvas persistentes e de alta intensidade. Em dezembro de 2024, o acumulado foi 87% acima da média histórica — e 2025 está seguindo o mesmo padrão. Isso não é apenas "tempo ruim"; é um sinal de mudança climática regional.

Os ventos de 120 km/h são comuns em Porto Alegre?

Não. Ventos acima de 100 km/h são raros na região metropolitana e ocorrem, em média, uma vez a cada 15 anos. O último evento semelhante foi em 2015, quando um ciclone extratropical atingiu o litoral. O que é preocupante agora é a frequência: em 2024 e 2025, já houve dois eventos de ventos extremos em apenas 12 meses. Isso sugere uma tendência de intensificação.

Como a mudança climática afeta o Rio Grande do Sul especificamente?

O sul do Brasil está entre as regiões mais vulneráveis à mudança climática no país. Estudos da UFRGS mostram que a temperatura média anual subiu 1,3°C desde 1980 — o dobro da média global. Além disso, eventos extremos como geadas em pleno verão e chuvas torrenciais em dezembro aumentaram 200% nas últimas duas décadas. O Rio Grande do Sul já perdeu R$ 12 bilhões em danos climáticos desde 2010, segundo o Banco Mundial.

O que o governo está fazendo para se preparar?

A resposta tem sido lenta. Embora o Instituto Nacional de Meteorologia emita alertas, a prefeitura de Porto Alegre ainda não implementou um plano de emergência climática para infraestrutura. Apenas 12% das áreas de risco têm drenagem adequada. Em 2024, o governo estadual aprovou um projeto de adaptação climática, mas ele ainda aguarda verba. Enquanto isso, moradores de bairros como Novo Hamburgo e Esteio continuam sem apoio estrutural.

As previsões para 2026 são mais alarmantes?

Sim. O Climatempo e o Inmet apontam para um verão de 2026 com maior variabilidade térmica, possíveis novos ciclones em fevereiro e até risco de granizo em áreas urbanas. A falta de preparação pode transformar eventos climáticos em tragédias humanitárias. A ciência já avisou: não é mais questão de "se" vai acontecer, mas "quando" e "quanto".

Maria Cardoso

Trabalho como jornalista de notícias e adoro escrever sobre os temas do dia a dia no Brasil. Minha paixão é informar e envolver-me com os leitores através de histórias relevantes e impactantes.

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